quarta-feira, 28 de junho de 2017

Poema da dor

Os poetas não são uns fingidores.
Sentem verdadeiramente dor de verdade.
Acredite ou não,
eles têm problemas clínicos seriíssimos.
Que os fazem parar
(e as enfermeiras de plantão bem o sabem)
no Sousa Aguiar
com uma puta dor de coluna.
Ou coração.
Ou um último bilhete no bolso.
Às pressas, racunhado.
Ou sem mesmo nada. Porque
nessas horas
quem é que vai pensar escrever alguma coisa?


sábado, 24 de junho de 2017

Luta

Não é a embriaguez que derruba.
É a lucidez que reluta.

Não é o amante que engana.
É ao engano que se ama.

Não é a dor que consente.
É a aspirina que é ineficiente.

Não é escrevendo uma poesia.
( - Que aí tudo se resolve!)

É inscrevendo-a na sua vida.

quinta-feira, 15 de junho de 2017

UM POEMA OU UM DIÁLOGO NA REDE

            (               ) ?
                      (               ) ...
                                 (               ) ???
                    (               ) !
                             (               ) ?...
                  (               ) ...!!!
           (               ) ?!
                                     (               ) ...?
           (               ) !!!
                                             (               ) ?
                                             (               ) .


quarta-feira, 14 de junho de 2017

Ex

Depois da alegria de umas cerjevas a mais, um amigo de anos disse que, naquela época, comia minha ex-mulher.

Fechei a cara, fingi que não tinha escutado, olhei pros lados, ignorando mesmo. Aliás, ela me ensinara isso! E me fiz de desentendido.

- Mas o jogo de ontem, hein?

E como insistia na vitória, peguei, num violento impulso, o casco de cerveja já vazio no pé sujo, que já tava pra fechar. Peguei com fome e sede. Atravessei  os olhos dele sem orientação, sem medir passado e consequências. Como quem corta um pedaço de pêssego ou carne fresca, disse:

-  Vamos pegar mais uma? Ou por essa fica?...

segunda-feira, 5 de junho de 2017

Um dia de domingo

Chego em casa.
Penso nos amigos
e tenho imensa ternura.

O cara que se separou, o do câncer,
o namoradeiro  que não imaginava se casar
e o que não se casou  por levar muito à sério a vida,
a história mal contada, e o da gafe ingênua e honesta.

- Ontem nasceu a última girafa. E era anã, disseram.

E todos rimos.
Rimos, sem nomes importantes
sem profissões duras
sem carros espetaculares
e namoradas-maquiagens
sem distinção ou discussão
de riso ou classe social.
Ríamos só.

Penso nos meus amigos
com a mesma ternura
que dedicaria aos outros.
Que não viram a girafa anã.
Mas vão ver
- quando estiverem extintas.