No tecido da noite
Foi nesse dia nu de areia fina
que bem soube ele que era sua vez:
da lua branca, esbelta, alta e cheia
na bracura imóvel da sua tez.
Nesse dia soube também amar
como o mar ama e lascivo quer
a virgindade secreta das rochas
e a voz inquietante de cada grão.
Porém... Diz, meu bem, como amar preso?
Entre os ossos dos tijolos da casa,
através do intransponível peso
do vidro surdo e opaco da janela?
Ama-se sem se ver realidade bela?
Foi por isso que assim resolveu
- não como quem simplesmente resolve
comparar poesias ao mistério do eu.
Foi por bem que com coragem resolveu,
como quem se resolve livre voar
nas asas noturnas e etéreas do ar,
como mariposa rumo à luz no breu.
Foi então, no ofuscado luzir do amor,
ao limite do penhasco e seu vão.
Não se jogar. Pois isso, senhor,
é coisa de jovem com depressão.
Mas iria lá por bem fotografar
a foto nunca vista, linda e bela,
do céu na lua, da lua lá no mar:
gotinhas de luz em escura tela.
Mas na liquidez sórdida da noite
terrivelmente e crua sombra surge:
- Passa bem cá, rápido e pra já
a carteira, relógio e seu celular.
Pois bem. Carteira o jovem não tinha.
Se a tinha, era de pouquíssima valia,
nem mesmo um centavo a mais sequer
do alto valor de sua violada da vida.
Do rapaz (cujo único desejo lá
era à bela namorada postar
a agulha do tempo em redes sociais)
ficou o pesar em páginas de jornais.
E o sonho do selfie com o céu
veio apenas como mais um grão
entre as pegadas cruas da vida.
E a pálida areia da lua jaz em paz
tecendo o frio da noite no chão.