quarta-feira, 2 de março de 2022

Trópico de Capricórnio


Era verão em São Paulo. Com a senhora minha mãe nos braços, minha esposa chegou em casa da igreja do bairro. Fechei o laptop onde via as últimas notícias. Aliás, tão pesadas como a tempestade que ameaçava. Ainda bem que chegaram, pensei sem ter muito certeza disso. E, como quem se esforça para afastar qualquer qualquer tentativa de interpretação maldosa, que faça manchar meu caráter com piadas sem graça - apesar de tudo -, tirei os óculos e perguntei com um semblante entre a esperança e consternação:

- Então... O padre deu alguma solução para guerra?

Um breve mas longo silêncio foi entrecortado pelo barulho nervoso e veloz do abrir e fechar do zíper da sua bolsa, onde vasculhou uma imensidão íntima, talvez até de palavras, antes, enfim, de responder abruptamente:

- Disse somente para orar.

Se, já com a camisola nos ombros magros, ela orou, não deu para perceber, foi no sussurro da alma. Mas lembro-me que, nesse dia, dormimos sobre a mesma cama como se houvesse uma fronteira imaginária entre nós. Depois, já não sei.

2 comentários:

Simone disse...

Muito boa reflexão ainda mais em tempo de guerra adorei querido poeta e grande contista parabéns

Ivo de Souza disse...

Muito obrigado 🌹