terça-feira, 17 de maio de 2011

Paredes


Por que deverei eu
ficar andando de lado ao outro no quarto
como quem não tivesse o que fazer?
Como quem nem quisesse observar
os livros, os móveis, o lixo
de papéis mórbidos, o fisico
imóvel das coisas? As coisas
que estão em volta das minhas voltas,
que volta porque não pode ir mais.
Senão daria a volta no mundo,
buscaria um horizonte profundo,
onde o mundo não pudesse mais voltar.
Mas neste curto mundo,
de quatro passos e uma foto 3X4,
minha volta sempre voltará.
Aqui no meu quarto não vejo
o mundo rodando
o mundo redondo
o mundo roendo.
Roda somente o meu calcanhar
a cada quatro passos.
O resto?...
O resto é o resto muito estático.
O resto está a contemplar calado
o meu ser agitado,
agitado e enjaulado como um leão
que só lhe resta passos em vão.
Os objetos que me cercam
não têm utilidade nenhuma.
São grades que observam a minha impassividade,
mas não impedem a minha agressividade.
Pois a isso chamo: ter liberdade.
São grades lógicas, bem armadas
que tentam ofuscar meus dentes e minhas garras.
São regras impostas
que a elas só importa
que eu bem me comporte.

Quero ir além dessa parede geométrica,
dessa grade geométrica,
dessa laje geométrica,
dessa imagem geométrica,
dessa métrica que mede
quatro passos.
Quero me libertar.
Por isso meus passos marcham;
por isso tenho passos inquietos;
por isso passo de um lado a outro perplexo;
por isso insisto;
por isso repito:
Vivo Vivo Vivo!
Não sou a morte destes livros,
Vivo!
destes discos, destes vidros,
Vivo!
não viverei no vício dessa visão geométrica.
Grito:
- Vislumbrarei sim a vida que me espera!
Ei, vida que me espera!
além dessas paredes de pedra,
além dessa rede geométrica.
Oh! mera rede geométrica,
vastos desejos me esperam.
Me esperam, e não me esperam muito.
Não me esperam nem um segundo.
Não me esperam nem um átomo perdido no mundo,
no mundo que dá voltas no mundo,
no mundo esquecido no mundo,
no giro rítmico do mundo.

Os desejos, já os tenho.
O mundo lá fora é muito grande,
mas o mundo que aqui contém,
entre quatro passos,
é bem maior do que o que há lá fora.
Se o mundo lá fora é grande pra fora,
o mundo aqui dentro é grande pra dentro.
Se o mundo lá fora já existe,
o mundo aqui dentro invento.
Se o mundo lá fora inexiste,
o mundo aqui dentro é vento.
Vento livre para voar,
vagar... viajar... circunavegar...
Inventar os lugares nunca inventados,
por homem nenhum. Talvez, nem Deus,
que dizem que inventou o mundo.
Porque eu invento Deus da maneira que quiser.
Eu invento o mundo!
E nem meu mundo é tão pequeno quanto aparenta.
Meu mundo não é um mero 3X4
com paredes em todos os lados.
Meu mundo venta nos quatro cantos do mundo,
venta em todos os cantos e arestas do mundo.
Meu mundo é explorado,
mas também explora o mundo.
Tenho meu tempo no mundo,
como o mundo tem meu tempo no mundo.
Tenho futuro, passado e presente,
como o mundo me tem ausente,
como eu o tenho aparente,
como se o real estivesse do outro lado da parede.
Lá, porém, só há o irreal,
que se realiza aqui dentro como real,
que é um real aparente,
que não diz a verdade nem mente,
que não para nem pensa,
só sente.

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