“A leitura do mundo precede a leitura da palavra”, Paulo Freire
Os livros e a parede
Com celular numa das mãos e no meio de uma obra, seu Jorge, 39 anos, 4a série incompleta (ou melhor, por completar junto com o reboco de seu barraco), pedreiro de profissão - e olha que diziam ser bom nisso - coçava a cabeça com um metro e tentava explicar. Mas...
- Pois então, seu Jorge. Na parede. Tá muito feio, entende?
- Sei. Mas é que...
- Tenho uma certa pressa. Tá tudo mofado. Infiltração, entende?
- Sei... É que agora...
- Meu filho tá com asma, minha mãe tá com renite. E minha esposa não para de reclamar, entende?
- Sei... Como eu ia dizendo....
- É bem atrás da estante. E tem livros. Muitos livros. Alguns raros até. É bem atrás deles. Uma mancha enorme... E preciso dos livros inteiros. Tenho que terminar meu doutorado, entende?
- Sei. Mas...
- E ando meio sem dinheiro, seu Jorge. Mas tenho que resolver isso urgentemente. Acho que vem do banheiro, do cano do banheiro. É uma mancha que caberia duas pessoas, entende?
- Sei. Olha...
- Então, seu Jorge. Você sabe como resolver isso e por quanto vai ficar?
- Sei... É o que eu tava tentando te dizer...
- Então diga logo, seu Jorge, diga... Por quanto, bem baratinho, por favor... Por quanto sai?...
- Aí... dr. Arnaldo... não sei...
- Como não sabe?!
- É que eu tenho que ir aí estudar.
4 comentários:
Adorei altamente filosofico e engraçado super singelo e bom de ler seu conto
Muito bom.
Perfeito o encaixe da frase de Paulo Freire.
A poesia do cotidiano...
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