domingo, 24 de janeiro de 2021

                                         A Cláudia Rocha


Poema dos sete erros


Ainda que o juízo, amor

seja sinuoso tal rio

que dos altos vales cai

e se biparte - igual setas 

de relógio - por lâminas

afiadíssimas de pedras,

ainda é isso: mangue e calor.


Ainda que seja estranho,

ainda é juízo sim: a raiz

do raio que reparte o céu

da erva que reparte terra

da terra que reparte homens

dos homens desajuizados

cujo ar é de chumbo e estanho.


Há juízo ainda em borboleta

sem rumo certo, na concha

do coração nu e profundo,

nos nós cegos dos seus dedos,

das mãos cujos alvos ossos

rangem como velha porta

de casa escura, à espreita.


Há juízo ainda na revolta

dos mares, na tempestade

sem perdão (lâmina arisca),

e ainda na fome infinita

de quem não tem nem sol, paz

e pão. Mas peito aberto na fé

pois o que prende um dia solta.


Tal piscar de vagalume,

vi mais juízo na gramática

etílica e vil dos poetas,

a vasculhar sal e silêncios

nos passinhos das formigas,

do que o pisar (des)botado

que sentencia - e resume.


Tal relâmpago no bosque,

vi mais juízo da criança

sentada ao meio-fio do mundo

em contar pingos na poça

do que o general de estrelas

contar vitórias e baixas,

igual baiacu que incha e explode.


Se me pedes juízo, amor

te digo que ainda prefiro

um erro seguro na mão 

a dois acertos voando.

É claro, não como pássaros

mas como míssil balístico

de precisão incerta e dor.



3 comentários:

Simone disse...

Que lindíssimo parabéns amigo e poeta de primeira necessidade epoema

Araciaba disse...

👏🏼👏🏼👏🏼

Lobo Moraes disse...

"...ví mais juízo da criança sentada ao meio- fio do mundo..." Massa.