Classe média
...notei que ela me agradecia,
revelando melhor sua delicada composição, Drummond
Entre sacos, garrafas
de vidro, latas
de coca, cacos
de lares guardados
em caixas de rivotril.
Entre o acúmulo
diário da fofoca
varrida, de pelos
de gato, cão, restos
de pele, unhas roídas,
bandaids de tédios.
Entre o gozo asfixiado
numa borracha, entre
o espiar cego da escada,
que queda em dominós,
ou o alçar súbito, veloz.
Entre códigos de barras,
o consumo atroz da classe
média. Das portas atrás
das casas. Das casas atrás
dos desejos. Dos desejos atrás
dos medos. E os medos atrás
das farpas na pontas dos dedos.
Entre todas essas coisas
e ainda o que não se vê
e ainda o que à deriva vai
como submerso iceberg
apartado de nossas vidas
polares, em inexorável fluir
as fugas dos sons dos ecos
nas paredes do céu e do mar.
Entre todas essas coisas
e ainda o que não se crê,
creia-me: eu achei (talvez
comprada às pressas,
tal como o vazio diário
lotado de bugigangas,
plásticos, calças, marcas,
cabides sem fala ou destino,
tal como o frio alvejado
das prateleiras sob o ar-
condicionado-a-ser-coisa
em toda humana causa).
Eu juro! Não foi um furto
de poeta ou anjo torto.
Em vaso, achei-a na terra,
que nos abraça aos pés
e encharca o dia e a alma.
De resistência singela
era pura, era bela, era flor.
Se fora descarte de lixo,
hoje bem a rego. E sou.
Feliz, sou homem. Rico.
6 comentários:
Grande poema belo texto adorei grande amigo
Belíssimo poema ! Vou tentar postar no me fb ( embora pouco saiba dessas coisas) . Parece um rap mas melhor , mais sofisticado..
Obrigado Simone! Sempre carinhosa comigo.
Sim, tem essa pegada veloz e urbana. Muito feliz pelo comentário. Aliás, a Estação tem me ensinado muito. Obrigado!
Parabéns pelo olhar agudo, ágil e sutil...🎶🌍🍀
Oba amigo. Obrigado!
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